Esse texto contém spoilers.
Tudo aconteceu de repente. OJ Haywood (Daniel Kaluuya) e seu pai cuidavam de um dos seus cavalos quando todos os aparelhos elétricos pararam de funcionar momentaneamente. Logo depois, inexplicavelmente, objetos como chaves e moedas começaram a cair do céu. Após a grave consequência desse evento, o rapaz e sua irmã Emerald (Keke Palmer) passam a investigar o que está escondido no céu.
Assim como fez em “Corra” (2017) e “Nós” (2019), o diretor e roteirista Jordan Peele volta a iniciar um filme de modo a nos fazer pensar “no que isso vai dar?”. Porém, dessa vez a trama se desenvolve de um modo um pouco menos original que nas obras anteriores. Não há nenhum transplante cerebral com motivação racista ou clones assustadores da população. Em “Não! Não Olhe”, os personagens principais são colocados sob o risco de serem abduzidos por um OVNI, algo que não é raro na história do cinema.
Porém, ao mesmo tempo que temem ser capturados, eles também possuem um desejo: gravar aquilo e apresentar ao mundo, no intuito de faturar um bom dinheiro. Quando fica claro que essa é a verdadeira missão dos personagens na trama, a história passa a fluir de modo mais interessante. Inclusive, isso é o que traz Angel Torres (Brandon Perea), jovem que aparece despretensiosamente como o caixa de uma loja, mas que vai ganhando espaço na narrativa por ter um grande interesse em seres extraterrestres.
Vê-los tentar capturar as imagens nos faz torcer pelos personagens. Quando uma das tentativas é frustrada pelo Louva-a-deus, o azar deles também nos irrita. No momento que o plano fica mais bem elaborado, nos empolgamos com as maiores chances de sucesso. Dito isso, chega um ponto em que o desejo incessante dos personagens de faturarem uma grana não faz mais sentido, pois o risco de morte parece muito maior que a chance de sucesso. Se ao menos a motivação fosse algo mais emocional, como vingar o pai que foi morto, o empenho deles seria mais coerente.
O desenvolvimento da narrativa também apresenta outros problemas. Um deles é relativo ao supervalorizado caso do macaco assassino, cuja ligação com a trama principal é mínima, o que decepciona o espectador que cria a expectativa por um elo mais relevante. Também é bastante incoerente o fato do Ricky ‘Jupe’ Park (Steven Yeun) realizar eventos mostrando o OVNI durante meses, sem que isso repercutisse chamando a atenção de curiosos, autoridades e jornalistas.
No papel do OJ Haywood, Daniel Kaluuya sabe expressar bem a personalidade de um protagonista tímido, dedicado aos negócios da família e escolhido pelo roteiro para ser o autor da principal descoberta: não olhar para o monstro voador garante a sobrevivência. Infelizmente, quem traduziu o título pro português acabou dando um spoiler dessa informação, pois não se atentou ao fato de que além de “Não”, “Nope” também pode ser traduzido como “Não é do Planeta Terra” (Not Of Planet Earth).
Se “Corra!” custou cerca de 4 milhões de dólares e “Nós” teve 24 milhões de dólares disponíveis, dessa vez há um grande salto orçamentário, pois os custos de “Não! Não Olhe!” estão estimados em 68 milhões de dólares. Grande parte dessa quantia certamente foi investida nos efeitos visuais. Por meio deles, o filme apresenta um OVNI bastante convincente ao tentar capturar seus alvos.
Por mais que o desfecho tenha momentos empolgantes, uma marcante aparição do OJ e um bom espaço para a Emerald brilhar, ainda fica a sensação de que o filme não foi tudo que poderia ter sido. Jordan Peele começou a carreira de diretor fazendo muito com pouco. Agora que possui mais recursos a sua disposição, ele precisará encontrar um caminho no qual saiba aproveitá-los e preservar a sua essência.