Sem conseguir sair de seu apartamento por possuir agorafobia, Anna Fox (Amy Adams) é acompanhada por um psicólogo e utiliza medicamentos para o distúrbio de ansiedade. Sentindo-se sozinha por não morar mais com o marido e a filha, a mulher leva uma vida calma na companhia de seu gato. Sempre observando a rotina dos vizinhos pela janela, ela testemunha um crime na residência de uma família recém-chegada, mas seu depoimento é questionado em virtude de sua condição psicológica.

Responsável por obras como “Orgulho & Preconceito” (2005) e “Anna Karenina” (2012), o britânico Joe Wright volta a dirigir um longa-metragem baseado em uma obra literária, no caso “A Mulher na Janela”, livro lançado em 2018 pelo escritor A.J. Finn. Entretanto, dessa vez sua adaptação cinematográfica demora a alcançar um ritmo que engaje o público.

O crime testemunhado por Anna só ocorre após 35 minutos de filme. Antes disso, ainda que as visitas dos membros da família Russell sejam uma novidade, a rotina dela está dentro do habitual. Além disso, diante do fato de que a mulher frequentemente consome medicamentos com vinho, o espectador mantém um certo ceticismo sobre se de fato ocorreu aquilo que assistimos sob a perspectiva dela.

Depois de demorar a mostrar ao que veio, a narrativa começa a apresentar surpresas. Uma delas faz bastante sentido, apesar de ser exibida de uma forma apelativa. Porém, a principal revelação parece muito forçada, pois não possui indícios ao longo da trama. Induzir o público a crer em uma coisa para depois apresentar outra é válido, desde que no fim tudo faça sentido. Entretanto, o filme termina devendo explicações sobre a relação entre dois importantes personagens.

Certas vezes, quando os roteiros deixam a desejar, os atores conseguem carregar nos ombros a missão de fazer seus personagens conquistarem a simpatia do público. Em “A Mulher na Janela” é visível esse esforço por parte da Amy Adams. Ela demonstra bem o medo da Anna em sair de casa, o olhar perdido quando a personagem está confusa e o afinco com o qual a mulher defende sua sanidade. Entretanto, o empenho da atriz é ofuscado pelas questionáveis decisões do roteiro.

Dentre o elenco de atores coadjuvantes, se destacam aqueles que interpretam os membros da família Russell. O consagrado Gary Oldman rouba a cena toda vez que aparece interpretando o austero Alistair. Apesar de sua participação breve, Julianne Moore protagoniza um dos melhores momentos do filme, quando sua personagem tem um diálogo envolvente com a Anna. Por fim, interpretando um filho oprimido pela criação do pai, Fred Hechinger possui uma atuação capaz de gerar diferentes emoções no público.

A adaptação cinematográfica conduzida pelo roteirista Tracy Letts deveria ter utilizado a edição como uma aliada. Apegada a cronologia, a história poderia ter se iniciado a partir do crime, o que conquistaria de imediato a atenção do público. Já os fatos exibidos anteriormente poderiam ser mostrados através de flashbacks, aproveitando perguntas do Detetive Little (Brian Tyree Henry) para desencadeá-los.

Um dos pontos fortes da obra está na residência da protagonista. Visivelmente, as equipes de cenografia e fotografia deram as mãos, pois criaram um ambiente coeso no qual se evidencia o vazio e a escuridão que tomam conta da vida de Anna. Mas a condição de saúde dela não é corretamente abordada quando a personagem cogita um suicídio. Sem ter existido qualquer tipo de aviso inicial sobre esse tipo de conteúdo, o filme mostra de forma irresponsável a maneira como ela planeja fazer isso.

É possível perceber uma tentativa de homenagear “Janela Indiscreta” (1954), não só por haver uma pessoa bisbilhotando os vizinhos, mas pela presença de uma câmera fotográfica profissional para observá-los, além da breve exibição de uma cena do clássico. Mas, infelizmente, Alfred Hitchcock ficaria decepcionado ao ver o desperdício de uma premissa tão promissora.