Tudo aconteceu de forma absolutamente repentina: as rádios saíram do ar, quase todos os carros pararam de funcionar e as cidades ficaram sem eletricidade. Além disso, ninguém consegue dormir por alguma razão ainda desconhecida, o que expõe a humanidade ao risco de extinção. Nesse pesadelo onde todos estão acordados, a solução pode estar na casa de Jill (Gina Rodriguez), pois a filha dela adormece normalmente.
É arriscado escrever um roteiro que parte de uma premissa na qual o mundo é transformado subitamente, pois grandes mudanças requerem explicações satisfatórias. E justamente isso é o que mais falta na história de Gregory Poirier, roteirizada pelos irmãos Joseph Raso e Mark Raso, sendo este último também o diretor do longa-metragem.
A trama de “Awake” faz o público pensar em quatro questões que não poderiam ficar sem respostas. A primeira é a causa toda essa situação, o que é respondido de forma superficial, mas aceitável. As outras dúvidas são se esse caos possuía uma solução capaz de salvar a humanidade, se exames na menina Matilda (Ariana Greenblatt) realmente poderiam ser úteis e qual a razão de apenas ela conseguir dormir.
As respostas são muito frágeis. O caminho apontado para solução da crise é desconexo da causa do problema, nem não possui uma justificativa médica minimamente satisfatória. Além disso, dada a dimensão global da situação, certamente essa resolução simples seria percebida em outras regiões. Assim, uma vez que a própria narrativa estabelece que ainda havia algum nível de comunicação internacional, não era necessário que a crise avançasse daquela maneira por tantos dias.
Inicialmente, o filme acerta em estabelecer o clima de caos numa sociedade que não consegue dormir. É inteligente colocar um grupo de pessoas buscando uma solução através da fé, conforme é habitual do ser humano em situações difíceis. Faz sentido que lojas abandonadas acabem saqueadas, prisioneiros fujam e militares atuem com um rigor cima do normal.
Só que depois, sob o pretexto de que o sono afeta o raciocínio, o roteiro vai criando uma série de conveniências para avançar com a narrativa, nas quais os personagens tomam decisões muito incongruentes. A edição também é oportunista ao, por exemplo, cortar de uma cena onde mãe e filha estão presas em um local perigoso para a fuga delas na floresta, sem explicar como as duas escaparam dali.
Interprete da protagonista, Gina Rodriguez consegue desempenhar bem o papel de uma mãe desesperada, ciente de sua provável morte e de que a filha pode acabar vivendo sozinha no mundo. Ao contrário do roteiro, a atuação dela melhora com o avançar da história, uma vez que ela é hábil em encenar uma pessoa esgotada pela falta de sono, mas que se empenha por uma causa maior.
A menina Ariana Greenblatt se saí muito bem ao interpretar a Matilda, pois a personagem possui reações coerentes para uma criança naquela situação. Ela é convincente, por exemplo, quando a garota rejeita a possibilidade de perder a mãe, além do momento onde ela se recusa a tocar numa arma, quando a Jill tenta treiná-la para uma possível vida solitária.
Tentando misturar ficção científica, ação, drama, suspense e aventura, o roteiro de “Awake” não consegue desenvolver-se bem em nenhum desses gêneros. Apresenta um problema global sob uma perspectiva familiar, o que é legitimo, mas apequena a dimensão dos eventos da história. Assim, fica a lição de que uma boa premissa pode até levar as pessoas a verem um filme, mas só uma grande história é capaz de torná-lo inesquecível.