Band of Brothers (Minissérie de 2001)

O ataque dos japoneses a base americana de Pearl Harbor não mudaria apenas a história da Segunda Guerra Mundial. Milhões de jovens tiveram seus planos e destinos alterados pela entrada dos Estados Unidos no conflito. Dentre eles estavam os paraquedistas da Companhia Easy, que entraram nos combates no famoso Dia D. O grupo era formado por rapazes de diferentes regiões, sotaques, profissões e níveis de escolaridade, que não se conheceriam em qualquer outra circunstância.

Três anos após o lançamento de “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), Tom Hanks e Steven Spielberg voltaram a trabalhar em um projeto relacionado a retomada da Europa pelos Aliados. Entretanto, dessa vez eles assumiram a função de produtores executivos da minissérie lançada pela HBO, em 9 de setembro de 2001, com orçamento de 125 milhões de dólares. Spielberg concentrou-se especialmente na avaliação das gravações do dia e da montagem, enquanto Hanks envolveu mais na criação, chegando a roteirizar e dirigir um episódio.

“Band of Brothers”, cuja tradução brasileira “Irmãos de Guerra” não pegou, teve seu roteiro baseado no livro de mesmo nome, escrito pelo historiador militar Stephen Ambrose. Ele redigiu a minissérie junto com outros sete roteiristas. Posteriormente, oito diretores dirigiram os dez episódios. Uma figura importante para a produção foi Dale Dye, que apareceu no papel do Coronel Robert Sink, mas não atuou apenas diante das câmeras. Veterano da Guerra do Vietnã, ele foi o consultor militar que contribuiu na busca pelo máximo possível de precisão histórica.

A superprodução foi gravada no interior da Inglaterra, onde várias localidades europeias por onde os militares passaram foram replicadas com suas construções danificadas, simulando os impactos causados pelas explosões e tiroteios das batalhas. O mesmo cuidado foi visto com os trajes, armamentos, veículos e objetos, que não só necessitavam ser de época, mas em muitos casos também precisavam parecer avariados e escassos. Alguns tanques e armas originais foram restaurados e utilizados em cena.

A primeira missão da Companhia Easy, exibida no segundo capítulo, não tinha nada de fácil. Uma vez que o desembarque marítimo dos Aliados no Dia D encontraria oponentes bem posicionados e com força total ao abrir fogo, coube aos paraquedistas saltarem atrás da linha inimiga para destruírem o máximo possível de armamentos deles.

Se a direção de Spielberg e a atuação de Tom Hanks, no filme de três anos antes, haviam exibido como era aterrorizante a chegada pelo mar, “Band of Brothers” mostra que saltar na Normandia, passando por cima dos rivais que disparavam sobre aviões e paraquedistas, era algo igualmente apavorante. E como não poderia deixar de ser, essa chegada a França é um dos melhores momentos da minissérie, por acompanharmos eles pularem em um território dominado pelos adversários, necessitando localizar uns aos outros para então iniciarem sua missão.

Tão marcante quanto isso é acompanhá-los em sua chegada a Bélgica, na situação que ficou conhecida com o Cerco de Bastogne. Os militares entram em uma zona de floresta para batalhar com pouca munição e medicações insuficientes, após verem os soldados que lhes antecederam saírem esgotados. Esse momento é utilizado para expressar várias situações difíceis que uma guerra pode impor, como por exemplo, a presença de um líder fraco que é mais uma adversidade para o grupo.

Ao longo dos dez capítulos, nos vemos diante de circunstâncias relacionadas ao conflito que jamais passariam pela nossa mente. Um exemplo é quando, pouco antes do embarque da Companhia Easy para o Dia D, a informação da morte em combate do irmão de um soldado chega até os colegas dele que ficam diante de um dilema: aquele homem deve receber essa informação, que pode abalá-lo profundamente, nos instantes que antecediam uma missão tão importante?

Uma vez que há uma busca por mostrar a relação de proximidade construída por aqueles rapazes, era necessário fazer com que nós espectadores também nos importássemos com eles. E isso é alcançado, pois sentimos como se fosse com a gente a angústia deles de não saberem onde ficar nos momentos em que a escuridão da noite é interrompida pela claridade das explosões. Entendemos a tensão da dúvida entre fazer um avanço que tende a ser rápido e dar muito certo, mas também pode acabar tragicamente. E ficamos tão impotentes quanto eles, nos instantes em que alguém é ferido e não há muito o que fazer.

À exceção de David Schwimmer, o Ross da série “Friends”, os atores que interpretam os membros da Companhia Easy eram pouco conhecidos pelo público na época do lançamento. Essa decisão fortaleceu a intenção de valorizar o conjunto dos militares e não alguém em específico. E ainda que a cada episódio um personagem assuma o protagonismo, isso não tem o objetivo de individualizar a aquele trecho da história, mas de mostrar as adversidades enfrentadas por todo o grupo através das vivências de um deles.

Entretanto, ainda assim alguns atores destacam-se. Damian Lewis e Ron Livingston, nos papeis de dois amigos que ocupam posições de comando, são alguns dos que se sobressaem. O primeiro, ao interpretar o Major Richard Winters, inclusive protagoniza o ótimo episódio dirigido por Tom Hanks, onde os acontecimentos são mostrados a partir das memórias do personagem ao escrever um relatório sobre os fatos daquele dia. O ator demonstra muito bem o impacto que uma situação corriqueira na guerra pode ter até mesmo em quem ocupa uma função de liderança.

Destaco ainda três atores que também possuem personagens que ficam abalados pela vida no conflito. O primeiro é Shane Taylor, no papel do cabo Eugene G. Roe, um jovem inexperiente que se torna médico naquela terrível circunstância. O sexto capítulo é sob o ponto de vista dele, que luta não só contra os alemães, mas também enfrenta a escassez de insumos médicos e a todo momento precisa socorrer alguém.

Os outros dois são Marc Warren, que interpretou o soldado Albert Blithe, e Neal McDonough, no papel do oficial Lynn Compton, mais conhecido como Buck. As atuações de ambos são importantíssimas na percepção do estado emocional em que os personagens deles se encontravam em diferentes partes da história. Através deles, “Band of Brothers” demonstra que o abalo causado pelo sofrimento emocional, numa época em que o psicológico era pouco levado em consideração, podia atingir tanto quanto ferimentos gerados por balas e estilhaços.

Se há momentos em que a vivência de um deles representa o sentimento de toda a Companhia Easy, também vemos instantes onde eles simbolizam todos os militares dos Aliados na Europa. Seja pelas condições de vida, as relações com prisioneiros e civis ou mesmo quando os problemas pessoais deles parecem pequenos, uma vez que se tornam testemunhas oculares de grandes acontecimentos. E quando isso ocorre, a minissérie não se exime de mostrar os fatos com uma veracidade que as vezes nem mesmo documentários conseguem expressar.

A parte sonora também é primorosa. O tema principal, apresentado principalmente na abertura, transmite simultaneamente a bravura daqueles homens, a resignação de quem sabe que sobreviver não será fácil e ainda o peso da tristeza causada pela perda de companheiros no conflito. A mixagem de som, por sua vez, contribui demais para a imersão nas cenas de combate, inserindo não somente o áudio daquilo que estamos vendo, mas criando toda a ambientação do que ocorre ao redor.

Essa não é uma minissérie feita para ser vista em ritmo de maratona, mesmo porque a exibição original ocorria com um capítulo a cada domingo. Especialmente a partir dos acontecimentos de 1945, é bom dar um tempo entre um episódio e outro para a experiência não ficar cansativa. Inclusive, “Band of Brothers” ajuda a desfazer a falsa percepção de que, nesse momento final da guerra, os Aliados apenas enfrentavam crianças e adolescentes despreparados para o combate.

Vale a pena conferir também o documentário “Easy Company – Uma História de Coragem” (We Stand Alone Together), onde os paraquedistas que ainda estavam vivos na época das gravações relatam suas experiências. Além de conter filmagens originais da época, mostrando como as cenas da minissérie reconstituíram fielmente aos fatos, as declarações deixam claro como também há uma fidelidade emocional nas ações, reações e relações dos personagens nos episódios. Alguns desses depoimentos inclusive são utilizados ao longo dos capítulos.

Sem dúvidas, “Band of Brothers” é uma daquelas produções que elevaram o nível de qualidade esperado pelo público em conteúdos produzidos para TV. Ao exibir as batalhas, não coloca isso como uma mera ação com fins de entretenimento, mas como se fosse a própria História sendo escrita. E ao mostrar desde o início a jornada daqueles homens comuns, de origens e vivências prévias tão distintas, revela como ao dividirem trincheiras eles importam-se uns com os outros como se estivessem juntos por toda uma vida.