Richard Williams (Will Smith) tem um plano: fazer suas filhas chegarem ao topo do tênis mundial. Só que ao abordar treinadores e empresários em busca de suporte, sempre ouve um argumento bastante plausível: quais as chances de duas campeãs crescerem sob o mesmo teto? Enquanto não consegue apoio, ele tenta protegê-las da violência ao redor e prepará-las para quando houver uma chance.

Nessa história onde muitos sabem o final, mas poucos conhecem o começo, nós entendemos como foi possível duas grandes campeãs terem sido formadas na mesma casa. Dirigido por Reinaldo Marcus Green (Monstros e Homens) e com roteiro do estreante Zach Baylin, “King Richard: Criando Campeãs” nos apresenta o início da carreira de Venus (Saniyya Sidney) e Serena Williams (Demi Singleton) sob a perspectiva do pai delas.

Quando a obra foi lançada nos Estados Unidos, uma filha do primeiro casamento de Richard fez duras críticas ao filme por contar aquilo que ela define como “metade da história”, já que ele abandonou os filhos do primeiro casamento. Entendo essa observação como parcialmente justa, pois o abandono é mencionado muito superficialmente em uma cena onde ele discute com a esposa Oracene (Aunjanue Ellis).

Existe uma frase do escritor Ernest Hemingway muito válida para a escrita de roteiros: “mostre, não conte”. O filme deveria sim ter seguido essa premissa e mostrado o momento onde o homem é confrontado pelos filhos. Dito isso, é injusto afirmar que essa obra apresenta Richard Williams como um homem perfeito. Em cena, nós encontramos seus traumas, impulsos e até uma certa vaidade.

O fato é que o longa-metragem faz um recorte da trajetória de seu protagonista, se voltando para o trecho da vida dele que é de interesse público. E faz isso muito bem, pois não o apresenta somente como um treinador obcecado que quer ver as filhas vencerem em Wimbledon. Encontramos um homem que coloca o pai acima do técnico, no intuito de protegê-las em um contexto muitas vezes nocivo, por colocar uma pressão enorme em quem ainda está em formação.

Ao interpretá-lo, Will Smith volta a viver um personagem real com a paternidade como sua principal missão, assim como fez em “À Procura da Felicidade” (2006). Novamente o vemos viver um homem obstinado, protetor e que gosta de transmitir lições. Todavia, o ator entende o histórico e a personalidade do Richard, o que lhe leva a transmitir essas características de modo diferente.

Ainda que na carreira como tenista a Serena tenha obtido maior êxito, a obra se volta mais para a trajetória da Venus, um ano mais velha e que fez sucesso mais cedo. Intérprete da primeira campeã da família Williams, Saniyya Sidney (Estrelas Além do Tempo) protagoniza com Will Smith uma cena marcante, na qual o Richard explica a motivação de uma proibição que ele havia feito. Um momento de emoção verdadeira e que por si só faz o filme valer a pena.

Junto com a Demi Singleton, Saniyya demonstra um excelente preparo nas cenas em que está jogando. Não vemos as duas simplesmente rebatendo as bolas que chegam, mas produzindo jogadas sofisticadas para resolver os lances das partidas. Além do bom trabalho das jovens atrizes, o tênis é apresentado no filme de forma interessante, seja pelo uso de ângulos mais próximos das jogadoras, por uma captação da quadra onde a câmera não está fixa e pela trilha sonora que reflete o momento do jogo.

Outro acerto está na reprodução fiel de aspectos da vida da família naquela época, como os penteados das garotas, as roupas do Richard e até mesmo a Kombi dele. Também é acertada a maneira como o preconceito e a violência são abordados, sem tornar isso maior que a trajetória dos Williams, mas mencionando como essas situações os afetava.

Ainda que seja uma obra na qual o público possui uma boa noção do que esperar, nos é apresentada muita autenticidade e nem sempre o roteiro toma os caminhos mais óbvios. Mostrando obstáculos enfrentados por tantos, mas que foram superados pelas campeãs, esse é um daqueles filmes inspiradores que certamente vamos querer ver mais de uma vez.