Coberta por uma estranha capa que envolve todo seu corpo, a paciente Omicron 267 (Mélanie Laurent) acorda após uma falha na câmara de criogenia médica. Sem conseguir sair daquele local, a mulher percebe que o oxigênio disponível está caindo. Carregando poucas e confusas memórias sobre sua vida até então, ela dialoga com uma inteligência artificial chamada M.I.L.O. (Mathieu Amalric), não apenas no intuito de escapar dali, mas também visando descobrir quem ela é, além de como foi parar lá.
Possuindo uma carreira marcada principalmente por obras de suspense e terror, o diretor francês Alexandre Aja usa bem sua experiência para apresentar uma trama imersiva. Se a câmara de criogenia poderia nos gerar certa claustrofobia ou até mesmo tédio, ele recorrentemente nos transporta para os pensamentos da protagonista, o que contribui com a necessidade de fazer a gente se sentir na pele dela.
As interações da moça com aquele ambiente são fundamentais para o desenvolvimento da narrativa. E aqui não me refiro apenas ao contato com a inteligência artificial. Repleto de painéis com informações e possuindo até mesmo holografias, a câmara é tanto uma antagonista, por possuir protocolos que complicam a jornada da personagem, como também uma auxiliar, ao possuir recursos que ajudam a mulher a buscar uma solução.
Enquanto cada canto do local é aproveitado pela história, a fotografia enfatiza a condição claustrofóbica vivenciada pela personagem. Captada em certo momento com uma distância que lhe mostra de corpo inteiro, a mulher parece estar viva em um caixão onde sofre pelo iminente fim do oxigênio. As reações dela são muito bem captadas, pois a câmera aproxima-se do rosto da atriz por variados ângulos. A iluminação do lugar também ajuda a dar o clima adequado para cada instante.
Nesse intuito de nos fazer sentir a experiência da personagem, nada contribui mais do que a ótima atuação de Mélanie Laurent, atriz que ficou conhecida pelo grande público no filme “Bastardos Inglórios” (2009). Mesmo com sua mobilidade limitada pelo espaço físico apertado, ela se movimenta de acordo com a angústia sentida pela mulher. Precisando entregar sua interpretação principalmente através das reações faciais, ela expressa bem sentimentos como desespero, raiva, surpresa, incerteza, satisfação e pavor.
À medida que algumas memórias retornam e a paciente Omicron 267 vai descobrindo sua história, a sagacidade dela perante a inteligência artificial vai fazendo mais sentido. Mas não é apenas a origem da personagem que precisa ser explicada, pois algumas dúvidas pairam na mente do espectador: ela realmente pode confiar nas pessoas com as quais se comunica? Diante da alta tecnologia apresentada, como é o mundo do qual ela faz parte? Além disso, qual a motivação por trás dessa situação?
Ao mesmo tempo que nos surpreende positivamente ao responder essas questões, a obra também apresenta certo prazer em gerar um desnecessário desconforto. Há uma busca por gerar sustos bobos no público, seja através de devaneios que fazem a personagem sentir-se cercada por ratos, como também por uma imagem assustadora projetada diante dela. Também geram incômodo as recorrentes remoções e inserções de agulhas na moça.
Apresentando uma mulher que se vê prestes a ficar sem oxigênio, sem saber quem é ela mesma, nem como foi ficar presa em uma câmara de criogenia, a trama te surpreende a cada descoberta da protagonista, mas fica devendo um final grandioso. Ainda que sua busca por sobrevivência ocorra em um ambiente estranho, não é difícil enxergar na situação dela algo que é comum na vida de todos: momentos de aparente impotência de onde não se escapa sem uma luta incansável.