Dez centavos. Esse é o custo para participar da sessão de leitura de notícias promovida pelo Capitão Jefferson Kyle Kidd (Tom Hanks), um veterano da Guerra Civil Americana que agora ganha a vida levando informações para localidades no norte do Texas. Em uma de suas viagens, ele encontra perdida a menina Johanna (Helena Zengel), que apesar da origem familiar alemã só se expressa na língua indígena Kiowa. Aos poucos, ele vai desvendando a trágica história da criança e decide enfrentar uma longa jornada para entregá-la aos familiares.

“Relatos do Mundo” é uma adaptação cinematográfica do livro “News of the World” de Paulette Jiles, publicado em 2016. O roteiro foi desenvolvido por Luke Davies e Paul Greengrass, sendo este último também o diretor do longa-metragem. Ele é conhecido por seus trabalhos em três filmes da franquia “Bourne”, pelo filme “United 93” (2006) e também por “Capitão Phillips” (2013), onde trabalhou com Tom Hanks pela primeira vez.

Ao nos levar para o Texas em 1870, Paul Greengrass nos ambienta numa região recém-derrotada no conflito que os forçou a abolir a escravidão. E uma vez que a dinâmica da vida estava mudando, ainda havia muita desordem por lá. Ao decidir encarar cerca de 640 km até Castroville, o Capitão Kidd estaria sozinho com a criança em uma estrada que nunca esteve tão perigosa.

À medida que o trajeto vai apresentando suas dificuldades, nós vamos percebendo que a dupla não está em conflito apenas com quem os ameaça. Ambos carregam as marcas de tragédias que ainda não conseguiram deixar para trás. Tendo visto muita coisa ao longo da guerra, o Capitão Kidd vive uma vida itinerante na qual está distante de sua esposa. Sozinha em um mundo no qual não é entendida, a menina Johanna sequer consegue falar na língua alemã, na qual foi criada pelos pais, pois o idioma lhe traz memórias de um grande trauma.

Tom Hanks novamente empresta seu carisma a um personagem de conduta exemplar. Entrega um grande trabalho como sempre faz. Entretanto, quem rouba a cena é a talentosa Helena Zengel. Ela é brilhante ao fazer sua personagem buscar expressar-se, não apenas através da língua Kiowa, mas também em ações que mostram o desespero que a garota vive.

Cada um ao seu modo, Tom e Helena transmitem tanto a tristeza que seus personagens carregam das vivências anteriores, como também sua coragem de seguir em frente e confiar no futuro. Os olhares dos dois são muito bem aproveitados pela fotografia através de planos fechados, especialmente no caso da garota, uma vez que suas expressões são fundamentais em sua comunicação.

Unindo a ambientação no faroeste, o peso das dificuldades enfrentadas e a ideia de busca do novo, a trilha sonora composta por James Newton Howard é belíssima, caindo como uma luva em cada instante que a história pede por ela. A edição de som também é acertada, principalmente por saber os momentos certos de preservar o silêncio, além de ser muito imersiva nos instantes de ação.

Uma vez que obras do gênero faroeste geralmente trazem como motivação a busca por vingança ou uma quantia em dinheiro, notoriamente a história de um homem que vai devolver uma menina para família pode não ser tão atrativa para muitos. O que verdadeiramente temos aqui é um drama ambientado no faroeste, no qual duas pessoas quebradas pela vida se encontram. Entretanto, Johanna e o Capitão Kidd nos presenteiam com uma vivência que quando lembrarmos no futuro nos trará boas lembranças.

Como em toda adaptação, quem leu o livro pode decepcionar-se com aquilo que foi mantido e o que foi deixado para trás. Apesar disso, é um fato que essa história funciona muito bem como uma obra cinematográfica, especialmente por possuir um bom ritmo e ao apresentar personagens que nos cativam desde o início. Os desfechos de algumas cenas e da própria história podem ser previsíveis, mas há boas surpresas ao longo do caminho.

Em “Relatos do Mundo”, somos apresentados a uma jornada de provações. A força de vontade do protagonista é testada o tempo todo. Acompanhar sua conduta diante das dificuldades faz a história valer a pena. A obra olha para ti e questiona: diante de problemas que são claros e ninguém quer resolver, como você reage?