A ameaça de uma Terceira Guerra Mundial sempre causou preocupação em qualquer pessoa que consiga imaginar suas consequências. Ao longo das décadas, situações de desfechos imprevisíveis — como a Crise dos Mísseis Cubanos ou os Atentados de 11 de setembro de 2001 — deixaram o mundo em alerta para possíveis conflitos nucleares. O que ninguém esperava é que a maior chance de desencadear a guerra não viria de uma disputa entre nações.

Se para todos nós a passagem do tempo é algo linear e intocável, nas mãos de Christopher Nolan isso é totalmente maleável. Roteirista e diretor de “Tenet” (2020), ao longo de sua carreira ele já nos fez viver experiências memoráveis, como ver uma história do fim para o começo ou viajar para um planeta onde cada hora equivale a sete anos na Terra.

Entretanto, dessa vez o uso do tempo não está apenas no modo de apresentar a história, nem como um aspecto que leva preocupação aos personagens apenas através do relógio. De algum modo, certos objetos como projéteis de arma de fogo passaram a existir na direção inversa do tempo. Assim, quando alguém aperta um gatilho a bala saí da parede e entra na arma.

John David Washington dá vida ao homem cujo nome não conhecemos, mas que se autodenomina como “o protagonista da operação” que visa evitar a guerra. O ator apresenta um personagem quase sempre tranquilo, de voz e reações faciais comedidas, mas com grande habilidade em lutas corporais. Em certos momentos, inclusive pela elegância, ele parece ser um novo James Bond. Sua jornada conta com o apoio de Neil, um rapaz de motivações misteriosas que é muito bem interpretado por Robert Pattinson.

Além de evitar a guerra, o protagonista também precisa garantir a segurança de Kat (Elizabeth Debicki), uma mulher que é afastada do filho e corre riscos por sua proximidade com o traficante de armas Sator (Kenneth Branagh). Além dela, o agente também se encontra com outras pessoas com informações valiosas. Entretanto, essas reuniões ocorrem em um curto espaço de tempo, o que torna um trecho da narrativa demasiadamente didático, podendo levar a uma perda da atenção do espectador.

Se em alguns instantes a história pode ficar brevemente tediosa, também há momentos onde o protagonista mergulha em situações arriscadas, sem saber com o que está lidando, para investigar melhor e entender o que precisa fazer. Há uma sequência em um aeroporto na qual é impossível o espectador se desconcentrar, mesmo porque o uso de um avião verdadeiro nas filmagens torna a cena bem realista.

Porém há outros aspectos que geram confusão, algo negativo para uma história que por si só já requer bastante atenção para ser compreendida. Um desses pontos está no fato de que, ainda no início, o roteiro estabelece o assunto tratado pelo protagonista como ultrassecreto, ao ponto de só puder ser discutido após uma certa palavra ser pronunciada e um determinado gesto ser feito. Isso se contradiz com a presença de dezenas de soldados lutando junto ao protagonista nos minutos finais.

A trilha sonora do filme ficou a cargo do talentoso Ludwig Göransson, conhecido por seus trabalhos em filmes como “Pantera Negra” (2018) e “Creed: Nascido para Lutar” (2015), além da série “The Mandalorian”. Ele transmite bem a tensão que o protagonista vive antes de entrar em ação ou quando teme ser descoberto. Em outros momentos, como numa sequência no trânsito, o compositor faz nossos ouvidos captarem toda adrenalina sentida pelo personagem principal.

Hábil em mexer com a passagem do tempo em suas obras, Nolan não conseguiu ter um bom julgamento sobre a hora certa para lançar “Tenet”. Indo no caminho contrário de dezenas de outros filmes adiados para 2021, ele convenceu a Warner Bros. a fazer o lançamento nos cinemas durante a pandemia de COVID-19. Apesar dos resultados da bilheteria terem pago os custos de produção, o faturamento abaixo de outros filmes do diretor indica que muitos espectadores perderam a oportunidade de ver o longa-metragem no cinema por conta da pressa para lançá-lo.

Em alguns instantes, ver “Tenet” é como ir ao museu ver uma obra de arte. Você olha para o quadro e não entende bem o que se passa ali, apesar de boquiaberto diante do que está vendo. Várias vezes nos perguntamos como certas cenas foram criadas. Sem dúvida estamos diante momentos que exigiram dias de preparação, além de meses de uma pós-produção que deverá ser lembrada na temporada de premiações.

Mas ainda que fiquemos confusos em certas horas, felizmente essa é uma obra em movimento e chega o instante onde as coisas começam a fazer sentido. Dentre aspectos da história um pouco mal explicados e acertos plantados no começo para serem colhidos no fim, o longa-metragem possui um saldo muito positivo, especialmente por seu desfecho.