Dona de uma lavanderia, Evelyn Wang se vê em uma rotina atribulada ao buscar dar conta do trabalho e dos cuidados com a família. Só que por mais caótica que sua vida possa parecer, seus desafios são comuns aos vivenciados por muitas outras pessoas. Porém, isso muda drasticamente quando a mente de seu marido é tomada por uma outra versão dele mesmo, vinda de uma realidade distinta no intuito de recrutar a Evelyn para salvar seu mundo.

No passado, filmes como “De Volta Para o Futuro 2” (1989), “Donnie Darko” (2001) e “Efeito Borboleta” (2004) surpreenderam ao lidar com múltiplas realidades, cada um ao seu modo. Hoje, obras como a série “Dark”, a animação “Rick e Morty” e as produções da Marvel tornam cada vez mais comum esse tipo de história. Deste modo, novas tramas relacionadas a multiversos possuem o desafio de apresentar isso de uma forma original.

Diretores e roteiristas de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, os irmãos Dan Kwan e Daniel Scheinert aceitaram essa missão e a cumpriram de forma criativa, divertida, bem executada e um pouco insana. A trama desenvolvida pelos dois acerta desde o início ao saber estabelecer um padrão de como era a vida dos personagens até ali, o que sentiam e aquilo que almejavam, nos apresentando eles o suficiente antes de começar a abordar outras realidades.

Quando as diferentes versões da existência começam a aparecer — muitas vezes de uma forma frenética que faz você querer ver o filme quadro a quadro — a obra utiliza o multiverso para nos fazer imaginar como nossas vidas seriam caso algumas de nossas decisões fossem diferentes. Evidentemente, ao apresentar essas várias realidades, nós assistimos a algumas possibilidades surreais que foram inseridas para nos divertir. Porém, isso não invalida os momentos de reflexão genuína.

Ainda que apresente essa variedade de universos, a trama cai no erro de se repetir em alguns instantes. No meio do filme, por exemplo, as cenas de lutas em um mesmo ambiente passam uma sensação de que a história está estagnada. Além disso, há uma funcionária de uma repartição pública que aparece recorrentemente durante a narrativa, como uma espécie de segunda vilã que pouco acrescenta ao embate principal.

Por mais criativo que seja o roteiro, o filme não seria um sucesso se tivesse faltado capricho em dois aspectos: o primeiro deles são os figurinos, muito úteis para distinguirmos os universos e rapidamente entendermos quem é a Evelyn em cada um deles. O segundo é a edição, brilhante ao saber apresentar as micro-histórias que se passam em cada realidade e que juntas contribuem com a trama principal. A montagem só não é perfeita por não ter conseguido evitar repetições que comprometem o ritmo da obra.

No elenco, ao meu ver quem mais se destaca é Stephanie Hsu. Intérprete da Joy Wang, ela entendeu muito bem a atmosfera excêntrica da obra e soube aplicar isso em sua atuação. Ao viver a protagonista, Michelle Yeoh precisa apresentá-la em realidades distintas, em alguns instantes como uma pessoa diferente, mas também como a mesma Evelyn no corpo de outra Evelyn. O problema é que quando a mente da protagonista alterna entre essas versões, nem sempre há uma continuidade emocional. Desse modo, as emoções das micro-histórias prevalecem sobre a narrativa principal. Um erro dos diretores ao conduzirem uma atriz que provou ser boa ao longo do filme.

Assistir a “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” é acima de tudo uma experiência cinematográfica diferente do habitual, porque essa é daquelas obras que se destacam não pela história, mas pela forma como é apresentada. O longa-metragem não tem a pretensão de ser compreendido por todos, nem de apresentar uma única interpretação. É simplesmente um daqueles filmes que daqui a cinco anos você vai se lembrar com um sorriso no rosto, talvez sem se recordar muito da história, mas com a nostalgia de uma obra muito peculiar.